No balcão do Noguti, eis que sou tocado
nas costas por uma jovem loura com um bebê no colo. “O senhor pode me dar um
trocadinho?” A minha primeira reação foi dizer “não”. Nada mais irritante que
alguém gozando de boa saúde preferir a esmola em vez do trabalho. Olho pra
criança que parece bem cuidada, bem arrumada. Olho pra mãe e percebo que é
jovem, forte, com cara de cansada. Mão na carteira, uma nota voa para o seu
bolso.
O tailandesinho não apareceu aqui.
Comigo? Até parece... Eu dei o dinheiro no automático, meu amigo, como se muda
a marcha de um carro. Mas eis que vejo uma moça de azul perguntar no balcão se
eles têm leite. Começo a bisbilhotar. “Morno”, a loura mãe intervém. Depois,
vejo a mamadeira da criança sendo preenchida com um mistura de leite com Nescau.
A jovem e seu filho sentados ao meu lado. A moça de azul lhe dando um salgado,
um suco de laranja. Fazendo um carinho na criança que mama. Pagando a conta com
satisfação. “Deus te acompanhe, viu?”, sai dizendo pra pequena família. “E
sorte pra vocês!”. “Deus lhe pague”, responde a mãe, com a boca cheia de
coxinha.
Saio de lá meio deprê. O tailandesinho
poderia ter nascido em mim, mas nasceu na moça de azul. Vai ver encontrou um
coração duro. E assim acontece todos os dias. Eu perdi a oportunidade. Ela não.
Ela fez o bem. Simples. No seu dia, nas suas horas apertadas, numa oportunidade
que apareceu, com boa vontade. Ela fez a diferença. Recebeu um sorriso, uma
manifestação de felicidade, um “Deus lhe pague”.
Já em casa, pensando no ocorrido, eis
que escuto alguém lá fora pedindo alguma coisa. Bingo! Meus olhos se arregalam.
Escuto minha secretária dizer que vai ver o que tem. Eu desço na frente. “Xá
comigo”. Pego um prato, cubro de arroz, feijão, um pouco de salsicha no molho,
purê, tudo quentinho saindo do fogão. Alface, tomate, cebola. Subo a escada em direção à porta com olhos de
satisfação, feliz da vida por ganhar uma segunda chance.
“Ué? Cadê? Onde foi parar o anjão?”,
digo pra mim mesmo. Vou até a esquina. Olho para um lado. Pro outro. Nada. O
cara sumiu. Pergunto à minha secretária. “Vai ver ele tava com pressa”, ela
diz. “É... Acho que estava mesmo”, concordo. “Não deu nem pra esperar o preparo
do prato, seu Geia? Mal-agradecido!”.
De modo a não perder aquele estado sublime
de compaixão, tão bom, que já via fugindo na velocidade de um gnu, procuro no
YouTube o tailandesinho pra me socorrer, a britadeira, o remédio de que preciso
pra desmanchar este coração de pedra.
Penso que a generosidade brota automaticamente, não é peso de consciência ou responsabilidade social. Tenho visto muita gente levantando a bandeira em defesa dos animais e outras coisas, porém, ao mesmo tempo q brada aos 4 ventos sua proteção, despeja rancor e raiva aos que não compactuam com sua ideologia. Vegano que quer q o mundo seja vegano e não importa a vontade do outro.
ResponderExcluirVocê dedicou seu tempo a preparar com cuidado e dedicação um prato para alguém q precisava, talvez não precisasse tanto. Foi embora e saiu perdendo.
Olha q curioso. Ainda não vi o vídeo do tal tailandesinho, mas depois de ler seu texto, vou procurar.