sábado, 19 de maio de 2012

Divagações

Como é boa aquela sensação de calma interior, de paz, um lago sereno, alegria incomparável, que não encontramos nas riquezas e bens materiais que o mundo secular oferece. Lembro-me de tê-la experimentado há muito tempo atrás, quando mais jovem, após ler a biografia de São Francisco de Assis, e me inspirar em suas ideias, ousei transformar teoria em ações concretas de apoio ao ser humano. Confesso que foi um período maravilhoso e inesquecível de minha vida, e que me sinalizou algo importante: quando nos doamos a alguém ou a alguma causa, experimentamos este sentimento imprescindível para a vida das pessoas. O mundo já produziu grandes figuras humanistas que doavam a sua vida ao próximo. Nem preciso citar, você sabe, e com certeza já lhe veio à mente várias delas. Outro dia vi pela televisão a entrevista de um padre de São Paulo cujo nome não me recordo, que se sentia incomodado de ir celebrar a sua missa diária, e se deparar com seres humanos se destruindo pelo uso de tóxicos, amontoados como entulhos ao redor de uma praça que enfeitava o suntuoso santuário. Isso existe aos montes. Mas esse padre fez diferente: incomodado por um bichinho que despertou, ele foi atrás, arregaçou as mangas e tratou de oferecer ajuda para aquelas pessoas, uma palavra amiga, criou um grupo multidisciplinar, ofereceu apoio especializado, abrigo, alimento. Fico absolutamente emocionado sempre que conto a história que li, relatada pelo atual Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Carlos Ayres Brito. Ele foi relator daquela ADI movida pela Procuradoria Geral da República contra dispositivos da lei de biossegurança, as pesquisas com células-tronco embrionárias. O Supremo marcou diversas audiências públicas para ouvir pesquisadores, médicos, advogados, a igreja etc. Numa delas, disse o Ministro, uma pesquisadora narrou que em certo dia, uma garotinha doce fez a seguinte pergunta: “doutora, por que a senhora não faz um buraco nas minhas costas e coloca uma pilha para que eu possa sair andando igual às minhas bonecas?”. Ele pensou: “como posso votar desfavoravelmente à constitucionalidade de uma lei tão importante para essas pessoas?” E concluiu: “Essa menina elaborou meu voto. A pilha sonhada seria algo obtido por meio das pesquisas com células-tronco”. Tenho absoluta certeza que é simplesmente incomensurável o bem que aquele padre e o senhor Carlos Ayres Brito proporcionaram a centenas de milhares de pessoas. Fizeram algo mais do que se esperava deles. Não escolheram a primeira opção, a mais simples, a mais fácil, a mais cômoda, a mais conveniente. Escolheram a segunda. A mais difícil, a mais desafiadora, a mais imprevisível, a mais humana. Seus gestos certamente nasceram do self superior, onde o amor resplandece com todo o seu brilho e altivez. Mas também, tenho a mesma convicção, que o bem que fizeram a si mesmos não se mede pelos meios convencionais. Encontraram aquela sensação de calma interior, de paz, um lago sereno, alegria incomparável, que não encontramos nas riquezas e bens materiais que o mundo secular oferece.

2 comentários:

  1. Num mundo onde o egoísmo impera, a doação ao próximo é algo sublime. Ótimas divagações...

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  2. Realmente ótimas divagações, mas acredito que o que mais falta em nossa sociedade são atitutes e quando falo isso não falo de atitutes grandiosas, mas sim de fazer a diferença em pequenas situações como pararmos de só nos importarmos com nosso próprio umbigo e doar algo de nós ao próximo que convive ao nosso lado, um sorriso,um gesto de carinho, de compreenssão, de tolerância, enfim plantarmos uma semente do bem no nosso dia a dia.
    Alguém que com certeza sabe o que diz, disse: ninguém é tão rico que não tenha o que receber e nem tão pobre que não tenha algo a dar.....

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Comunicado

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