Um
domingo ensolarado e quente. Depois de minha caminhada matinal, depois de tomar
um café caprichado na padaria, depois de vencer o supermercado, fui cumprir o
meu dever cívico de sempre, e votar no prefeito e no vereador que escolhi para
me representar nos próximos quatro anos.
Não
está fácil escolher. Aliás, a cada ano que passa fica mais difícil. Vereador,
nem se fale. O critério que escolhi este ano foi votar numa pessoa que conheço,
que sei que é digna, que é comprometida com valores humanos essenciais, tem boa
formação, que é integra, e que é uma pessoa amiga. Com base nesses critérios o
escolhi, e acredito que ele possa bem me representar na Câmara.
E
lhe avisei que estava votando nele. Desde a última eleição municipal que adoto esta
postura. Alguns dias antes, aviso ao meu candidato que estou votando nele. Se
ganhar, ótimo. É o meu representante. E lhe cobrarei atitudes dignas e sérias
no legislativo.
Porque
pesquisar a vida do candidato, ouvir suas propostas, sua ideologia, sinceramente?
Pra mim é tudo balela. O cara ganha, experimenta o gostinho do poder, e muda da
água pro vinho. Exemplo clássico é o Lula. A vida inteira defendeu algumas
bandeiras, e foi contra em outras tantas. Quem votou nele por ideologia deve
ter se decepcionado. O cara mudou completamente o discurso depois que se tornou
presidente.
Mas
meu domingo foi muito especial. Não por causa da eleição. Não diretamente, eu
quero dizer. Voto no Municipal. Deixei meu carro estacionado na rua Professor
Moreira. Segui a pé até a escola.
A
rua Professor Moreira é uma rua comprida que começa ali próximo ao Municipal e
termina lá embaixo, quase chegando à Praça da CTI.
Minha
avó morou lá, na casa de número 545. Ao descer do carro, confesso que fiquei
emocionado ao lembrar minha história naquela rua. Quanta coisa vivi por lá!
Quantas pessoas amigas! Quantas peripécias!
De
cara encontrei a Ousana. Continua morando na frente da casa que foi da minha
vó. Foi minha chefe por anos na Prefeitura. Uma pessoa amável, admirável e supercompetente.
Nos abraçamos e senti naquele momento que o dia prometia. Que alegria...
Tinha
muitas crianças naquela rua. Eu saía lá da Desembargador pra brincar na casa da
minha avó. O Bola, o Dito, o Helinho, o Carlão, o Maurício, o Odevanir, o João
Alberto, o Gustavo, o Paulo Castilho, o Fernando, o Adriano, o Grô, o Geovane. Tanta gente. Brincávamos
de bolinha de gude, esconde-esconde, polícia e ladrão, bafo, empinar pipa. A
rua era nossa.
Jogávamos
bola na lagoa – ou no campinho ou no campão, hoje ambos tomados de casas.
Quantas vezes, de noite, eu peguei o meu violão e fiquei tocando na frente da
casa da minha avó...
Dona
Lourença. Ou Lourenza. Ou Laurença. A minha avó era avó de todos, não importa o
nome. Com seu cabelinho branco escasso ela ficava encostada no muro vendo os
alunos indo pra escola, voltando da escola, a criançada da rua.
Quem
não está mais lá é o Valdir. Nem sua casa. No espaço hoje tem um prédio. Lembro
de um domingo que a criançada toda se agitou com o jogo maneiro que passava na
televisão dele. Nós fomos lá jogar futebol ou tênis. Podia escolher. Telejogo.
Nem existe mais. Se perguntar para os jovens de hoje, nem saberão o que é.
Naquela época era a última geração no segmento de jogos eletrônicos.
Uma
vez pisei em cacos de vidro e meu pé se encheu deles. Nada de deixarem botar
uma agulha sequer nele. O pé é meu, com ele faço o que quero. Andei mancando
por vários dias, só colocando o calcanhar no chão. Eis que aparece o Chaveco
atiçando a criançada. Todo domingo ele distribuía doces e chocolates por lá.
Mesmo mancando eu fui receber a minha parte. Depois, minha tia me pegou de
jeito.
As
lembranças são tantas que poderia ficar escrevendo o dia inteiro. E você com
certeza já teria desistido e me mandado passear.
Depois
de votar, fiquei lá uns dez minutos numa sombra aprazível com minha mulher. Vendo
as casas, conferindo as mudanças, procurando encontrar alguém conhecido. Não
encontrei ninguém. Tudo bem. Por tudo que estava sentindo, meu domingo de
eleição já tinha sido pintado com outras cores. E ficou mais bonito.