sábado, 26 de abril de 2014

O símbolo perdido

É com enorme pesar que comunico aos senhores e senhoras leitores: meu amigo Marcão, tão avesso às coisas novas desse mundo, tão resistente à profusão de tecnologia que brota como capim nas lojas e centros das catedrais do consumo, num rompante de pura contradição, cujas causas desconheço, mas que serão objeto de investigação oportuna, disse não ao seu velho e bom companheiro, para sucumbir às tentações do novo mundo.
Não parei de correr para não perder o ritmo, mas como sempre ele estava lá, na mesma praça, no mesmo banco, as mesmas flores, o mesmo jardim. Confesso que demorei alguns segundos para decifrar o mistério. Quando caiu a ficha, senti o coração apertar: cadê o seu companheiro? E num piscar de olhos, a imagem tomou conta da tela, fazendo inundar a visão com o pequeno orifício de seu orelhão (Marcão sempre foi orelhudo), e eu notei, flanando quase imperceptível, os fios, finos e frios, de um minúsculo fone de ouvido.
A imagem, a outra, sempre provocara boas sensações: ele ali, sentadinho, alegre, bem ao lado de seu radinho (e não eram companheiros?), ouvindo canções antigas, sereno, às vezes olhando pro céu, alheio ao movimento regular de carros e de gente que passava com pressa, e que nem notava a sua presença.
Deitava no pensamento umas lembranças saborosas, com cheiros e sons e tudo. E nesse mosaico memorialístico que me inundava, era ele quem desempenhava um protagonismo rudimentar. Eu me lembrava do meu, velho e bom, aquele que me acompanhou durante a infância, e que me acordava todas as manhãs gritando uma moda de raiz, junto com o cheirinho aconchegante de café passado a filtro de pano.
Não sei se o Marcão é aposentado, se é rico, se trabalha para alguns comerciantes do entorno (já o vi várias vezes varrendo a calçada), ou se vive à custa de sua mulher ou de seus pais. Também, isso não importa. O que importa é o que o Marcão representa para mim: o símbolo da resistência, o símbolo do “não” aos avanços desenfreados de um mundo louco.
Não, Marcão, você não. Não é a simples troca de um aparelho velho por um mais sofisticado. Isso é o de menos. O que pega aí é o que essa permuta inocente e antenada com a visão de mundo moderno representa: o símbolo perdido. A subserviência ao novo que, como um trator, passa por tudo o que é velho mas que foi bom e que continua sendo, que tem o seu charme, e que um dia foi importante na vida de muita gente. Que digam os motorrádios, as vitrolas, as remingtons, as facits, as fitas cassetes, os vinis...
Minha corrida ficou mais triste. Lembrei-me de como é broxante para mim a imagem do povo no estádio assistindo ao jogo com a televisãozinha na mão, vendo sua imagem correr as telas. O cara faz pose e quando vai avisar o amigo a câmera se esquece dele.
Pelamordedeus!
Marcão, você não, meu amigo!

 

sábado, 19 de abril de 2014

Jota Cê

Lembrei-me daquele dia, e, principalmente da nossa conversa, quando abri a correspondência destinada a mim, de um tal de Pintores com a Boca e os Pés Ltda. “Pintores com a boca?”, pensei. “E com os pés?” Hum, sei não... Eram cartões com desenhos de paisagens maravilhosas, pintados, segundo a cartinha que os acompanhava, com a boca ou com os pés. Eles pediam um pagamento pelos cartões. R$39,50.  Pagamento? Sei. Fui pesquisar. E descobri que se tratava de algo sério, uma associação fundada em 1956 por Erich Stegmann, que tem por objetivo proporcionar “uma vida independente para artistas que não têm o uso de suas mãos. Todos os membros dessa sociedade internacional são incapacitados de pintar usando suas mãos, e todos são beneficiados com a satisfação em poder ganhar seu próprio sustento, independente de caridade”. Sacumé, né? Tem muitos aproveitadores, a gente precisa se acautelar. Mas a conversa se avivou na mente.
“Preciso de um padre”, eu disse, já procurando não sei o que na maçaroca de papéis sobre a mesa. Ele me olhou assustado. “Um desenho”, acrescentei, voltando os olhos para os papéis. “Um desenho de padre”.
Embora deficiente físico (depois de um acidente de moto, perdera os movimentos da mão e do braço direito), e destro, Jota é um bom desenhista com a mão esquerda. Aliás, teve de reaprender a fazer tudo o que fazia antes, agora usando somente o braço e a mão esquerda. Conseguiu. Exceto tocar violão, talvez, sua maior paixão.
Jota é um artista. Tocou na noite. Deu canja com gente da pesada, como o Lula Barbosa, o Marcinho Eiras, o David Maia, a Maria Eugênia. Depois do acidente, sem os movimentos do braço direito, abandonou o violão. Mas a arte não abandonou Jota, que me entregou naquele final de dia o desenho que pedi, com traços perfeitos, simples, prontinho para estampar a capa do meu livro.
 Conversávamos sobre um sujeito que se dizia inválido para o trabalho, que não podia fazer mais nada, que pensava em requerer aposentadoria porque tinha perdido os movimentos de uma das mãos após sofrer um acidente de trabalho. Jota estava indignado. “Como inválido? A pessoa não tem noção da sua real capacidade...” Argumentei que as pessoas adoram se vitimizar. “Talvez seja mais fácil viver representando o papel do coitadinho, do pobrezinho...” Ele retrucou: “A vaga de um supermercado destinada ao deficiente físico, por exemplo, foi criada para a pessoa com dificuldade de locomoção, mas o cara que tem um problema na mão também usa a vaga e se acha no direito; o mesmo acontece na fila de banco. Isso, pra mim, não é o exercício de um direito, mas sim um abuso”.
Jota é um cidadão, um cara lúcido, dono de um pensamento refinado, que precisa de muito pouco pra viver, que detesta shopping, que curte os textos do Paulo Leminski, a música do Itamar Assunção, que não troca de celular três vezes por ano, mas somente quando o aparelho pifa, que prefere a panela e o fogão à mesa do restaurante, que valoriza o que tem. E um artista de mão cheia. Pra sobreviver, assim como centenas de milhares de artistas brasilianos, precisa enfiar as mãos onde a arte não chega.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Lançamento

Sem palavras. Honestamente. Sem palavras. Obrigadíssimo a todos que me cederam um pouco de seus preciosos tempos para estarem comigo lá na Nobel, dividindo esse momento especial. Que ficou lotada. A fila saindo da loja. Tomando o corredor do shopping. Que bacana! Obrigado ao primo Wagner Geia que veio de Pinda. Obrigado ao primo e revisor do livro João Guarnieri, que veio de Ubatuba. Aos queridos amigos advogados que se deslocaram de São José dos Campos e Caçapava. Obrigado aos queridos servidores da VT de Caçapava. Ao MM Juiz do Trabalho de Caçapava, Dr. Orlando Amâncio Taveira, que se deslocou de Campinas para o lançamento. Obrigado aos amigos de São José dos Campos, Caçapava e Taubaté, e a minha família, que veio em peso. Entendo perfeitamente os queridos que não puderam comparecer. Espero que conheçam o livro. Depois a gente bate um papo. Na Livraria Nobel, do Via Vale Garden Shopping, em Taubaté. Lá você adquire um exemplar. os queridos amigos advogados que se se deslocaram de São José dos Campos e Caçapava. Obrigado aos meus queridos servidores da VT de Caçapava. Ao MM Juiz os queridos amigos advogados que se se deslocaram de São José dos Campos e Caçapava. Obrigado aos meus queridos servidores da VT de Caçapava. Ao MM Juiz do Trabalho de Caçapava, dr. Orlando Amâncio Taveira, que se deslocou de Campinas para o lançamento. Obrigado aos meus amigos de Taubaté e a minha família, que veio em peso. Entendo perfeitamente os queridos que não puderam comparecer. Espero que conheçam o livro. Depois a gente bate um papo. Na Livraria Nobel, do Via Vale. Lá você adquire um exemplar. E me fale. Terei o maior prazer em rabiscar umas tortas palavras na primeira página. Mas sinceras. Um gde abraço, meus amigos. E vamos que vamos. Nos próximos dias postarei umas fotos. E farei mais alguns comentários.


sexta-feira, 11 de abril de 2014

Juventude

Na tevê o padre dizia que uma senhora se aproximou dele pra conversar. Num dado momento, começou a realçar sua jovialidade. “Nossa, padre, mas o senhor ainda é muito jovem!” “Em absoluto! Em absoluto! Eu não sou jovem! E não quero ser jovem! A juventude foi uma fase boa, mas passou!” Segundo o padre, a busca pela eterna juventude, baseada na ideia de que é a fase mais bela da vida humana, é um conceito absolutamente falso. Todas as fases podem ser maravilhosas, dependendo da cabeça de cada um. Arremata dizendo que seu sonho é se tornar um sábio ancião.
Nessa tarde gloriosa estava eu em stand by, sentado no sofá da sala, chupando umas mexericas. Stand by? É! Nem ligado nem desligado. Estava disponível, digamos. Se estivesse desligado as palavras do padre voariam. Mas, em “stand by”, elas entraram junto com os gominhos, e cá estou falando delas. E confesso que penso igual. Em parte, é claro. Em parte. Não que eu discorde de parte do que o padre falou. Eu apenas não tenho a mesma ambição. Pra mim, encerrar a jornada como um velho já tá de bom tamanho.
Todas as fases da vida podem ser maravilhosas se soubermos aproveitá-las. O padre está certíssimo. Porém, com o avanço da idade, certas coisas podem se tornar um pouco mais complicadas. Normal. De repente você cresce em sabedoria (se bem que nem todo mundo consegue evoluir nesse quesito, he,he,he), mas tem aquele negócio de decadência física. Eu, por exemplo. Outro dia tava pensando em como era cortar as unhas dos pés aos dezoito. Quer saber? Nem lembro. Sinal que era fácil. Não tinha barriga. A vista funcionava que era uma beleza.
Há um autor que explora muito bem essa temática, o Philip Roth. Mas, ao contrário do padre, Philip detona a velhice. Para ele, a velhice não é uma batalha, é um massacre. O tempo transforma o corpo humano num armazém de aparelhos artificiais cuja função será adiar o colapso. No livro Homem Comum, sua visão açodada inquieta: “Que agora não era ele próprio mais nada, apenas um zero imóvel, aguardando com raiva a bênção de um aniquilamento absoluto”.
Me perguntam se tenho medo da morte. Nada! A gente não sente bulhufas quando dorme, sente? Você ronca, inadvertidamente acerta o braço na sua mulher, baba, fala, uma porção de coisas, e não se dá conta, dá? Você não tem a mínima ideia. Só se lembra que deitou para dormir, e que acordou no dia seguinte. A morte é a mesma coisa, tipo sono pesado, inconsciência pura, um nada absoluto. Agora, a decadência física que o Roth trata sem dourar a pílula, e da qual não conseguir cortar as unhas dos pés é só o começo, ah, isso me assusta. E tem aquele negócio da inexorabilidade. Você pode fazer arranjozinhos se quiser, puxar um pedaço ali, outro lá, pagar para que suguem suas adiposidades, tornar-se um velho saudável, malhar, correr, alimentar-se direito, mas a garantia é zero.
Apesar de tudo isso aí, desse monstro que uma hora vai te pegar, ainda assim é possível dizer que a juventude não é a melhor fase da vida. Não! Não é!
P.S.: Excepcionalmente postado nesta sexta-feira 

              

quinta-feira, 10 de abril de 2014

Hoje

Na Nobel do Via Vale. A partir das 6 da tarde (às 5 eu já estarei lá). Esperando você. Para apresentar "Confidências". Um romance. Um romance bacana (rsrsrs). Espero sinceramente que ele possa lhe trazer algo novo. Ou algo bom. Ou simplesmente prazer. Prazer e inquietação. Quem sabe... Então fica assim. Te vejo lá.








quarta-feira, 9 de abril de 2014

Amanhã

Me lembra a música do Guilherme Arantes. Pois é. Dia 10, que estava tão longe, agora tá aí. Quero agradecer desde já o carinho de todos que estão compartilhando o convite no face e foram muitos compartilhamentos; que me encontram na rua e falam "é dia 10!". É Isso que vale a pena. Ver que os amigos colocam você no colo e abraçam uma ideia. Meus queridos, MUITÍSSIMO OBRIGADO! A direção geral é do Mário Cabral de Vasconcelos. A editoração eletrônica e a capa é de André Luiz Cabral de Vasconcelos. A revisão é do João Claudio Guarnieri. A ilustração da capa é do Julio Cesar Prado Santos. Então vamos que vamos. Amanha espero vocês na Livraria Nobel do Via Vale Garden Shopping, em Taubaté, a partir das 6 da tarde.








domingo, 6 de abril de 2014

Está chegando, meus amigos

O dia. É quinta, 10/04, a partir das 6 da tarde. Na Livraria Nobel, do Via Vale Garden Shopping. Em Taubaté. Meu primeiro romance. A ilustração da capa é do meu amigo Julio Cesar Prado Santos. A revisão é do João Claudio Guarnieri. “Confidências” é ficção. Personagens e situações irreais. No universo ficcional eles vivem. Mas só lá. Espero vocês. E continuem me ajudando. Valeu!!! 


sábado, 5 de abril de 2014

Perrengue

O telefone da repartição estava ocupado. Aderbal, um fiscal de obras à beira da aposentadoria, tentava resolver de uma vez o problema do cancelamento do cartão.
“Bom dia! Aderbal da Silva. Eu queria cancelar meu cartão de crédito. Sim, está no meu nome. Como? Seis meses. Não, eu uso muito pouco. Não, não interessa. Meu CPF? Claro! É 068XXXXXX-XX. Sim, obrigado.” Eu continuava trabalhando na conferência de uns documentos, mas não tinha como não prestar atenção na conversa. “Ela me passou para outra pessoa. É a chefe dela”, diz, muito compenetrado.
“Pois não? Ah, sim! Meu nome? É Aderbal da Silva. Eu queria cancelar meu cartão. Cartão de crédito. Sim, no meu nome. Seis meses, mais ou menos. Então, não compensa manter o cartão, você entende, né? A taxa é alta e eu uso pouco. Não, não interessa. Não, mocinha, muito obrigado, mesmo assim prefiro cancelar mesmo. Não interessa, não. É 068XXXXXX-XX. Sim, sim. Rua Félix Guisard, XX, Belém. Taubaté. Ah, pois não.” Ele, agora tapando o aparelho, diz baixinho: “É muita burocracia. Me passaram para outra pessoa”. Depois de alguns minutos, ele retoma a conversa:
“Pois não? Ah, sim! Meu nome? Poxa... é Aderbal da Silva” — vejo ele murchando — “Eu gostaria de cancelar o cartão” — e ficando vermelho. “Está no meu nome. Aderbal da Silva!” — aumenta o tom da voz — “Eu não quero mais! Não interessa! Não, mocinha, não interessa, eu quero cancelar mesmo! É 068XXXXXX-XX. RG? Poxa, mas vocês são enrolados demais, agora o RG? É 18XXXXXX. Félix Guisard, XX, Belém. Mocinha!? Moc... Como assim? Ah, não, não é possível! Ela me passou para outra pessoa!”. Eu, por dentro, choro de rir. Coitado do Aderbal. Mas o pior ainda estava por vir. “Caiu a ligação. Não é possível! Caiu a ligação! Ah, não vou fazer mais isso agora! Tenha santa paciência!”. Vejo-o bater o fone no gancho e sair bufando.
Esta cena, real, aconteceu em 1990, num departamento da Prefeitura de Taubaté. De lá pra cá, já se vão mais de 20 anos. O leitor há de concordar comigo que seria razoável conceber que um “Perrengue de Aderbal” (vamos cunhá-lo assim?) ficou no passado, quando o sistema SAC engatinhava, quando nós tínhamos ainda uma constituição fresquinha, código de defesa do consumidor debutando, mal tínhamos linha telefônica à disposição e pessoas defendendo os interesses da classe consumidora.
Hoje, tudo mudou! Claro! O sistema tomou banho de tecnologia, abriu-se o mercado, vieram as operadoras. Portanto, nem dei bola quando um raio detonou o modem da minha internet. Que isso! Fácil! Vou ligar, informar o problema, e rapidamente eles vão resolver. Traz um modem novo, leva o queimado. Simples.
Ledo engano. Descobri que o perrengue é mais sofisticado, mas continua, e o sofrimento é o mesmo. Primeiro, pra ser atendido. Numa das vezes (foram várias, é claro), cheguei a ficar esperando no telefone mais de duas horas. Depois, a virtualização. O virtual, que está na nossa casa, no namoro, na amizade, no sexo, agora também tá no serviço de assistência técnica. Eles não querem mandar um técnico na sua casa, eles querem resolver de lá. Mesmo eu informando que o modem tava mais morto que D. Pedro I. Lembrei-me do Aderbal. Sem chorar de rir, é claro.

Comunicado

O autor informa que suas crônicas estão sendo publicadas com exclusividade na página Crônica do Dia ( www.cronicadodia.com.br ). Convida...