sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Propaganda Eleitoral Gratuita


Nojenta a propaganda dos candidatos a prefeito de Taubaté na televisão. Será que toda eleição é a mesma coisa? O candidato que está na frente apresenta seu plano de governo. Os que estão atrás dividem o tempo entre plano de governo e ataques pessoais ao candidato que está na frente. Será que é muito difícil pra eles apenas apresentarem o que pretendem na prefeitura sem atacar quem quer que seja?
Estive no feirão de carros no último domingo e soltaram um panfleto lá dizendo que o Junior Ortiz tinha visitado terreiro de macumba e que os religiosos estavam loucos da vida com ele. Eu me pergunto: e daí? Ainda que fosse verdade (não sei se é), o que isso ter a ver com a capacidade de governar de um candidato? Sem contar que qualquer terreiro aos olhos maldosos é terreiro de macumba. O que isso significa num contexto eleitoral a não ser arrancar do candidato votos dos religiosos? É muita sujeira.
A eleição tá chegando. Infelizmente o nível da propaganda continuará tão baixo quanto está. Acho que vai piorar. Eu me pergunto qual o sentido de tudo isso. Esse acesso gratuito aos meios de comunicação para os partidos produzirem essa coisa chata e baixa que se vê por aí?
Sem contar que eles têm solução para todos os problemas da cidade. Num passe de mágica. Vote em mim e seus problemas acabaram! Ele vai fazer, ele sabe como fazer, ele vai resolver...
E o que o Lula veio fazer aqui? No meio do julgamento do mensalão (segundo o advogado do ex-deputado Roberto Jefferson, Luiz Corrêa Barbosa, Lula teria de ser um “pateta” ou um “deficiente” para não saber da existência do mensalão) ele tem a cara de pau de vir aqui pedir votos para um candidato? Todo mundo lembra quem ele apoiou na última eleição? Será que ele se esqueceu? Depois dos últimos quatro anos, ele teria de ter vergonha de aparecer por aqui.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

A avenida da minha infância


A avenida da minha infância não é mais a mesma. Em nenhum aspecto. Lembro que no verão, quando o sol ardia e o chão queimava nossos pés, as cigarras cantavam alegremente. Mesmo dentro de casa vendo tevê ou brincando, não tinha como reduzir o volume daquele som. Ele invadia os nossos ouvidos de forma tão refratária que o jeito era se acostumar.
A avenida não era asfaltada, tanto que no período das chuvas, formavam-se poças e mais poças de água barrenta. Eu ficava horas na janela do quarto de minha mãe vendo as pessoas pedalarem suas bikes entre as poças.
Na avenida da minha infância eu jogava bola. No meio do canteiro. Os dois lados da avenida eram as laterais do nosso campo. Automóvel era coisa rara de ver, mas quando vinha um a gente parava o jogo pra recomeçar depois.
Hoje não jogam bola mais na avenida. Não tem criança. O asfalto cobriu as poças de água e o nosso campinho. As cigarras foram embora. Os meus amigos também.
A avenida da minha infância não existe mais.

sábado, 22 de setembro de 2012

Anita (ato final)


Joaquim preferiu a igreja. O celibato. A vida sacerdotal. A segurança financeira. Depois da conversa que colocou fim na história, ele nunca mais encontrou Anita.
Dizem por aí que se arrependeu, principalmente depois do que aconteceu. Eu tenho certeza disso!
No entanto, ele nunca deixou transparecer este sentimento. Sempre foi um bom padre. A idade aperfeiçoou suas qualidades, aumentou-lhe a sabedoria, deu-lhe instrumental para o exercício pleno da vocação.
De fato, poucos padres que conheço merecem a minha consideração. Eles não se importam com o ser humano, com seus defeitos, com sua natureza imperfeita. Pensam que fazem muito administrando os templos, celebrando missas, casamentos, batizados, mas não cuidam do que realmente importa: o templo vivo que reside em cada um de nós. Joaquim tem a minha consideração.
Apesar de achar que ele seria mais feliz com Anita, tenho-o como exemplo de ser humano. Mais do que um padre, Joaquim é um ser humano valioso.
Não o culpo pela fatalidade. Se Anita voltou à antiga vidinha, não foi culpa sua. É claro que Deus foi muito cruel com os dois. Atirar-se de um dos viadutos da rodovia Presidente Dutra não foi o final que merecia aquela jovem linda, mas problemática.
Anita morreu, mas Joaquim é quem vive a sua morte todos os dias. 

fim

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Trechos de um concerto


De repente André Rieu fica em segundo plano. Eu me detenho nela. Depois de vender muitas pipocas, de subir e descer escadas, de andar pra lá e pra cá, ela dá o expediente por encerrado. Em vez de ir embora como a maioria de seus colegas, prefere ficar. Senta no degrau gelado e se deixa inundar pela ária.

sábado, 15 de setembro de 2012

Anita (ato 6)


Mas Anita estava enganada. Ele tinha sim sido tocado por sua história. Não deu bola para o que diziam os outros padres. Não deu bola para os preceitos velhos de uma igreja velha. Gastou tardes inteiras com ela, ensinando, orientando, despejando-lhe um palavreado simples, mas profundo, que ia direto ao ponto. Se naquela manhã ele se mostrou frio e apressado, depois, foi como se tivesse saído de um poço de serenidade.
E tirou-a da rua. E levou-a até um lugar maravilhoso onde pela primeira vez na vida sentiu-se respeitada, amada, cuidada. Lá encontrou o que precisava. Aproveitou cada minuto. Fez amizades, conheceu pessoas tão sofridas e desprezadas quanto ela (algumas até mais), compartilhou experiências, recebeu ajuda, mas também conseguiu ser ajuda.
Trabalhou como nunca: de manhã, após as orações e o café, tinha de tratar da horta, colher verduras para o almoço, adubar, semear, regar. Tinha também a limpeza do pátio e dos dormitórios, o cozimento, a preparação das refeições, a louça.
Compartilhavam alegremente os serviços. A filosofia da fazenda estava baseada num tripé: trabalho, oração e convivência. Todos que estavam ali sabiam que aquele era um lugar especial, portanto, cuidavam dele com carinho.
Foi uma mistura de alegria e tristeza o dia que deixou a fazenda. Alegria por ter vencido o vício, e ter encontrado uma família. Tristeza por deixar a fazenda, os diretores, os voluntários, os amigos. Mas outros chegavam (como ela chegara um dia), e com eles a desconfiança, a resistência, o desespero.
Sempre enxergou em Joaquim um amigo. Quando a situação começou a mudar, Anita se desesperou. Pensou em jogar tudo para o alto, voltar à rua, fugir, mas não era justo com ela.
Eis as premissas do conflito, meu amigo: Anita tinha que reprimir um sentimento que nascia em seu coração, no entanto, não sabia como. Sua única saída, pensava, seria a fuga. Sumir pelo mundo, desaparecer.
Não teve forças. Sucumbiu à paixão. Amou. Redescobriu o prazer do sexo. Permitiu-se planejar o futuro, sonhar, viajar em devaneios idílicos.
Uma loucura isto sim, insensatez absoluta. Ela mesma fez essa avaliação em algumas ocasiões. A cegueira, porém, não permitiu a Anita fincar os pés no chão e tomar um banho de realidade. Desfrutou daquele sonho o quanto pôde. Até não dar mais. 

(último ato na próxima semana)

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Estradas cheias no feriadão


Quem desceu a serra neste feriadão de sete de setembro sofreu. Tereza, a minha colega de trabalho, gastou seis horas de Taubaté a Ubatuba. Normalmente a gente faz em uma hora e quarenta. A Ana Rita levou quatro horas e meia para fazer o mesmo caminho, em sentido inverso. Não dá. E dizem que o povo está sem dinheiro, mas basta um feriadinho prolongado para as estradas encherem.
Outro aspecto. Os reflexos do aumento da produção da indústria automobilística ao longo dos últimos anos, e ainda potencializados agora pela redução do IPI estão aí. Hoje todo mundo tem carro. Hoje todo mundo pega a estrada. Só se esqueceram de uma coisa básica: o tamanho das estradas, das ruas, das avenidas, é o mesmo. Onde nós vamos parar minha gente? E nas cidades então? 
As autoridades nada fazem. Transporte público de qualidade não existe.  Já tem gente propondo pedágio urbano.
Não gostou da ideia? Nem precisa espernear.
É só o começo.

sábado, 8 de setembro de 2012

Anita (ato 5)


Anita desde o início sabia dos riscos que corria ao se envolver com Joaquim. Ela tentara fugir da armadilha no início, ao perceber o que estava acontecendo. Mas não deu. Deixou Joaquim ocupar um espaço muito grande em sua vida. Um erro grave.
Ela nunca teve uma família de verdade. Sua mãe a odiava. Pode parecer forte, mas é verdade. Já o pai era um canalha. Um pedófilo que a deflorou.  Até onde sei, ela não tinha nenhum parente por perto. O encantamento por Joaquim então se deu de uma forma natural e muito fácil. Se não tinha, ela encontrou simplesmente uma razão para viver.
Antes, ela só pensava em se matar. Encontrara o fundo do poço. Dava para malandros, velhos, traficantes, qualquer um disposto a pagar seu preço. Não tinha a menor esperança de ver as coisas mudarem. Estava dominada pelo vício, pela bebida, pelas drogas.
Procurou Joaquim na igreja como última esperança. Nem sabe direito que força a impulsionou naquele momento. Ouviu apenas alguém dizer na porta da Catedral que ali estava um padre diferente, um padre que se preocupava com as pessoas. Não acreditou muito, mas mesmo assim esperou um pouco e o nome dele chegou aos seus ouvidos: padre Joaquim... Da paróquia do Belém.
Não podia imaginar que aquela história fosse verdadeira (e era; realmente ele se preocupava com as pessoas) e que ele fosse procurá-la justamente em seu ponto de prostituição.
Sua visita à igreja, digamos, não foi o que ela imaginava. Ela percebeu a reação contrariada de Joaquim, como se quem batesse à porta fosse a mais odiosa das criaturas. Disse que estava atrasado. Ainda assim, após ela insistir, com indisfarçável má vontade, aceitou atendê-la em confissão.
Ficou vermelho ao ouvir seus pecados. Mandou-a rezar trinta vezes o Pai-nosso, trinta vezes a Ave-Maria. Depois a dispensou com pressa. Como poderia imaginar que sua história pudesse atingir o coração aparentemente impenetrável daquele homem?
Saiu de lá pior do que entrou. Desprezada por um padre que se dizia de Deus, mas que não demonstrava a mínima preocupação com uma de suas criaturas. Cumpriu a cartilha. Ouviu seus pecados (com pressa). Deu-lhe a absolvição, a penitência, um sorriso calculado de despedida. E um tenha um bom dia! 

(continua na próxima semana)

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Carpinejar


“Meus pais me pediram: Fabrício, não converse com estranhos. E eu deixei de me escutar.”

Nunca li nada do Fabrício Carpinejar. Aliás, nem o conhecia, o que, por sinal, é imperdoável. O cara tá aí, publicando, blogando, ganhando prêmios. Mas sua figura excêntrica me chamou a atenção. E não é que ele bate um bolão!  Fabrício parece integrar aquela casta de mortais que rebanha amor ou ódio de alguém. Agitadíssimo, deu uma entrevista deliciosa para o site da FLIP.  Pena que durou tão pouco. O final é digno de registro (citado acima). Um verdadeiro convite para conhecer sua obra. Veja a entrevista aqui http://globotv.globo.com/globocom/g1-flip/v/flip-2012-sobremesa-entrevista-com-fabricio-carpinejar/2031053/

sábado, 1 de setembro de 2012

Anita (ato 4)


Tudo bem. Estava decidido. Mas gostaria de saber, sinceramente, o que ele quis dizer com “estava decidido”. Estava decidido o quê? Que ele daria um pé na bunda dela?
Desculpa, desculpa... Essas coisas me tiram do sério.
É que com o passar do tempo Anita foi criando, digamos, uma certa dependência de Joaquim. Uma paixão louca. A pobre nunca amou ou foi amada na vida. Joaquim aparece e lhe estende o tapete vermelho. Um cara amoroso, atencioso, prestativo, disposto a largar tudo pra viver com ela. O que você acha?
Só que ele, em sentido inverso, descobre que só Anita não basta, e que a igreja, esta sim, a santa madre igreja, é a sua companheira de verdade, aquela que escolheu para viver do seu lado o resto da vida. É claro que eu dizendo isso você pode pensar que a coisa aconteceu assim, do dia pra noite. Não, não, ele foi enrolando a pobre, enrolando até não dar mais.
Joaquim se deliciava com Anita, mas era só bater a porta da rua e voltar para o mundo que a igreja tomava conta de seu pensamento. Como era um homem correto, é claro que sofreu com o erro cometido. Sofreu muito. Sim, num determinado momento ele se convenceu de que sua relação com Anita tinha sido um enorme equívoco.
Foi nesses momentos de angústia, de confusão, que Joaquim pôde contar com um amigo, um pouco mais experiente que ele, mais vivido, e acima de tudo, capaz de lhe guiar na escuridão que se tornara sua vida: Constantino.
Eram da mesma cidade, cresceram juntos e estudaram no mesmo seminário. Só se separaram quando Joaquim escolheu a Diocese de Taubaté, enquanto Constantino preferiu ficar em Campanha.
A Diocese de Campanha possuía um seminário em Taubaté, acho que já lhe falei disso, lá pelos lados do Santa Cruz do Areão. O seminaristas então, por algum tempo, estudavam na cidade; alguns gostavam e ficavam.
Constantino foi o primeiro a perceber o erro cometido por Joaquim. Aconselhou-o. Orientou-o. Trouxe-o de volta para o chão. Fê-lo perceber que sua vocação era realmente o sacerdócio.
Conseguiu arrastá-lo até Campanha. Joaquim ficou hospedado em sua casa. Uma semana. Uma semana intensa, que proporcionou uma espécie de aclaramento das ideias.
Disposto a trazer seu amigo de volta para a igreja, Constantino planejou aqueles dias com enorme zelo, como se estivesse organizando um retiro de padres ou um encontro religioso.
Ocupou a semana inteira com diversas atividades, celebrações, visitas a seminários, reuniões de pastoral. Proporcionou a Joaquim um reencontro com sua vocação. Visitaram comunidades pobres, celebraram missas em lugares distantes, atenderam confissão, participaram de quermesses, festinhas de igreja, bingos. Joaquim encontrou neste mergulho as raízes de sua vocação: o trabalho com os pobres.
Tanto que outro homem apareceu na casa de Anita numa noite. Ela percebeu a mudança, e nem precisou ouvir as explicações para entender tudo.

Comunicado

O autor informa que suas crônicas estão sendo publicadas com exclusividade na página Crônica do Dia ( www.cronicadodia.com.br ). Convida...