Logo pensei: esse negócio de crítico, sei não... Mas ele sabia do que estava falando. Comprei o CD e gostei de uma ou duas músicas. As outras, não. Decidi, porém, seguir a sua cartilha. Ouvi uma, duas, dez vezes. Deitado na cama; no carro, indo pro trabalho; enquanto tomava banho. Mas ouvi mesmo, não aquele negócio de fundo musical, a cabeça em outro lugar. E o que foi que descobri? Que todas, todas as músicas eram maravilhosas.
Desde então
adotei a técnica. Quando compro um CD, evito julgamentos à primeira ouvida. Tento
me acostumar com as canções. Ouço diversas vezes. Parece que você vai
desnudando o artista aos poucos. Cada vez que você ouve a mesma melodia, você
encontra uma coisa nova. É um manancial inesgotável de sensações. Você vai
penetrando na alma do artista, vai descobrindo o que ele está pensando, o que
ele está te entregando naquela canção. Quando o cara é bom, como o Chico, você
ouve um montão de vezes, não enjoa, e sempre encontra algo novo. O CD “Chico”
pra mim tem o mesmo valor que uma ametista para os garimpeiros de Marabá.
Dia desses
comprei um CD nas Americanas, uma coletânea do Gil. Sim, sim, eu gosto de
diversas músicas dele, como “Estrela”, que acho de um lirismo fantástico, “Palco”,
e algumas outras, mas nunca tinha ouvido a maioria de suas canções, e com esse desejo
novo de descoberta.
E descobri cada joia.
“Drão”. A impressão que tenho é que “Drão” (Drão é o apelido da ex-mulher de
Gil) já possuía uma existência cósmica. Ela já existia imaterialmente, viajando
por aí. Gil, num momento de ruptura existencial nada fácil, reuniu seus pedaços,
pequenas porções que flutuavam no universo, como bolas de sabão, e
materializou-os numa canção de encher os olhos. Cada adjetivo, cada frase, cada
rima, tudo tão bem colocado, tudo redondinho. E de uma profundidade colossal.
“Estrela” também
me dá essa sensação. De que já existia. De que faltava apenas encontrar o cara,
o escultor que iria descobri-la vagando em algum lugar desconhecido, que iria
pegar a ideia (a tal inspiração), uma caneta, um papel, e materializá-la numa
canção, a fim de que pudesse se fazer ouvir, que pudesse embalar o ouvido dos
mais sensíveis, daqueles que se deixam tocar por uma coisa extraordinária
chamada música.
“A paz” me deixa
em paz todas as vezes que a ouço. A música é do João Donato, e no CD Gil explica
como compôs a letra. Sensacional ele dividir esse instante tão mágico e íntimo
com os seus fãs. Sim, porque compor uma melodia com nesse nível de refinamento,
eu só posso definir como um momento de sofisticada alquimia. Gil é um alquimista
das canções. Descobri “A novidade” só agora, pode? Mas ela não ficou velha. E
tenho certeza que vou descobrir muito mais desse gênio chamado Gilberto Gil.
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