Tenho a sensação de estar mastigando
uma massa insossa. Falta sal. Esse ingrediente combatido por muitos, mas que
torna a bacalhoada de final de ano, ou a feijoada gorda de domingo, ou qualquer
outro prato fino ou ralé, um manjar dos deuses.
O queijo da vez era um queijo branco,
mineiro, comprado numa loja especializada em produtos das Minas Gerais. A
textura era boa, macia, se apertasse um pouco com a faca no pão francês,
passaria com louvores por um bom requeijão.
Minha mulher me disse que tinham três
tipos de queijo branco e que pediu a vendedora que desse o mais salgadinho, já sabedora
de minhas reclamações.
Não vou dizer que o queijo era ruim, de
jeito nenhum. Melhor que muitos que já passaram por aqui. Mas o sabor era muito
suave. Eu sentia o sal, mas depois de muito esforço e concentração, depois de
atravessar uma cortina de sensações e sabores que se pareciam com coisa
nenhuma, com o nada absoluto.
A ditadura da saúde está acabando com
os queijos brancos. O vilão é o sódio. Estão dizendo que o queijo branco tem
alta concentração de sódio, e que o brasileiro está consumindo mais sódio do
que deveria. Eu pergunto: onde? Onde está essa maravilha dos deuses? Onde está
esse bendito queijo salgado? Tragam já à minha mesa!
A verdade é que daqui a pouco eles vão
abolir com o nosso sagrado café da manhã. Você já experimentou fazer uma
pesquisinha sobre o assunto? Eu fiz. Queijo branco: possui uma concentração
média de 505 mg de sódio por porção de 100 gramas; alta concentração de sódio
no organismo significa infarto, derrame, hipertensão, obesidade etc. Pão
francês: a presença de carboidratos refinados trazem risco para o sistema
cardiovascular. Café: a longo prazo, pode causar gastrite,
insônia e perda de qualidade do sono, refluxo gastroesofágico, alterações
vocais e laríngeas, doenças cardíacas, como aumento do número de infartos e
pressão arterial sistêmica...
No meu devaneio matinal,
despejando minha verborragia ácida no ouvido de minha mulher, ela esperou
serenamente uma pausa para me projetar, com sua voz suave, para um rio gelado
de realidade: “você se esquece desse comprimidinho aí que você toma todo dia,
Sergio Geia? Que eu saiba quem tem pressão alta deve evitar o sal!”.
As perspectivas são sombrias,
meu caro. Aos poucos, eles conseguem o que querem. Não duvido que um dia eu
ainda encontre a minha mesa de café da manhã elegantemente posta, como só minha
mulher sabe fazer. Mas com chá, sem açúcar, e pão integral, puro. E uma maçã.
A verdade é que eles têm o
seu valor. Estão fazendo o trabalho que lhes cabe, zelando pela saúde da raça.
Querem acabar com os fumantes, com os obesos, com os amantes da boa mesa, com
os cachaceiros de plantão. Querem acabar com tudo que é bom e gostoso. Querem
edificar uma sociedade saudável. Fazem tudo o que podem em prol do bem estar e
da saúde humana.
Tristes dias.
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