Ferver um litro de leite é um teste de
paciência. Não adianta olhar de minuto em minuto pra ver se já formou nata, se
tá subindo, se tá na hora de desligar. Nessas horas, ele parece que quer
brincar com você, testar o seu limite, porque passa um tempão e você olha pro
fundo da leiteira, e ele tá lá, lisinho, lisinho, que nem bumbum de neném. Agora,
deixe-o lá, deixe. Vá fazer outras coisas pra ganhar o dia. Passe manteiga no
pão, esprema a laranja, coe o café, vá ao banheiro. Faça isso tudo, faça. Não
mais que dois minutinhos e pronto.
Continuei pensando: se ambas as
situações fossem colocadas à luz da ciência, se um técnico de um desses
institutos que avaliam as qualidades de nossas máquinas lhe fizesse uma
visitinha, a fim de testar a qualidade do seu fogo, e nesse teste usasse dentre
outras, de uma leiteira cheia de leite, não tenho dúvida nenhuma em afirmar que
suas medições comprovariam que o tempo gasto na fervura, considerando as duas
situações, seria exatamente igual. Bom, então o problema não é do leite?
Talvez fosse interessante chamar um outro
técnico a fim de examinar a máquina humana, para tentar descobrir o que se
passa com ela. Não sei se seria uma boa ideia. Se ele fosse um profissional
sério, talvez abandonasse a profissão ao mergulhar no mar de sombras que é esse
tal de humano. Porém, como estamos trabalhando no mundo das hipóteses,
dispenso, por ora, e com todo o respeito que ele deva merecer, o senhor
técnico, e mesmo sem diploma, faço eu mesmo o diagnóstico.
A máquina sofre de uma síndrome muito
comum que, embora não tenha galgado ainda o foco de preocupação da Organização
Mundial da Saúde, dá mais que chuchu na cerca: a “síndrome do polvo”. Já ouviu
falar? Não? O Homo sapiens não se contenta em fazer uma coisa de cada vez. Como
tem muitos braços, quer fazer tudo o que pode, no limite de suas potencialidades,
e ao mesmo tempo. E se acostumou com isso. Você acha que uma máquina dessas,
acostumada a viver lá na frente, ou lá atrás, mas nunca no lugar em que realmente
está, produto mal-acabado de uma sociedade desumana e doente, vai se render a
uma simples leiteira, e perder dois minutinhos de seu precioso tempo, não
fazendo nada?
Como não sou desse jeito, graças a
Deus, agradeci mais uma vez ao Senhor por me dar de presente neste momento, uma
leiteira pra pensar. Assim, do nada. Pelo menos tirei da cabeça esse timinho
que ultimamente só me dá tristeza.
P.S.: esta crônica foi escrita após a
derrota do Palmeiras para o Sport no primeiro turno do Campeonato Brasileiro da
Série B. Quase foi apagada, considerando que depois daquele jogo o Palmeiras se
recuperou e triturou os seus adversários. Foi um passeio, vai. Flanamos. E
voltamos para o nosso lugar, de onde nunca deveríamos ter saído. Dá-lhe,
Palestra!!!
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