quarta-feira, 4 de julho de 2012

Uma morte estúpida

1. No esquife, colocado no centro da sala escura, jaz serenamente um sujeito velho, cabelos brancos, rugas no rosto, e um semblante de boa gente. Ao redor, pessoas choram e sentem aquela partida inesperada. Duas mulheres – as filhas, não se conformam, e tentam a todo o custo, manejando delicados lenços de cambraia, estancar a água salgada que cai dos olhos. Algumas criancinhas – as netas, choram amparadas pela avó, que de todos, parece a mais forte. Uma morte estúpida – é só o que se ouve. Uma morte estúpida.

2. Ele esquece de acionar a seta ao estacionar. Um sujeito de moto que estava atrás, começa a xingá-lo usando todo o seu repertório de palavrões. Por mais que esteja errado, ninguém gosta de ser xingado em praça pública. Apesar da idade e da pouca força, ele desce do carro e responde à altura. Depois de xingamentos mútuos, o sujeito grandalhão joga o capacete com raiva, empurra seu desafeto que cai e dispara à queima-roupa.

3. A polícia derruba a porta velha e encontra a família reunida. A mulher, uma mulata gorda, chora abraçada ao marido e aos seus dois filhos. Os policiais não entendem a cena. Olham ao redor: uma cozinha ordinária, fogão, geladeira, pia, armários, mesa e cadeiras. Tudo bem arrumado. O homem, após beijar a mulher e as crianças, se levanta com as mãos para cima e não oferece resistência. Na calçada, os policiais ainda ouvem o choro que vem de dentro.

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