Acho que pior que ela, só mesmo uma dor
de dente. Eu me lembro que na infância, ficava horas deitadão na cama com
aquela esmagação pulsante, a sensação de que tinha alguém enfiando uma faca na
minha boca. E torcendo. Não tinha remédio que desse jeito. Se bem que faz tempo
que eu não sei mais o que é isso. Bastou um pouco de disciplina, fio dental,
escovações e visitas regulares ao dentista. Uma fórmula simplória, mas que
produz resultados interessantes. Enxaqueca não! Não há fórmula simplória.
Outro dia, um amigo me disse que nunca
sentiu dor de cabeça. Não acreditei. “Porra, não pode ser! Nunca?” “Nunca. Eu
não sei o que é isso”. O cara nunca experimentou a sensação de ter dor de
cabeça. Pelamor...
Já fui a médicos. Já fiz tudo quanto é
exame. Enxaqueca, o diagnóstico. Enxaqueca. Não sei se sou meio indisciplinado,
se os remédios não foram lá com a minha cara, só sei que toda semana ela vem,
às vezes no meio da tarde, chega como quem não quer nada, vai tomando seu lugarzinho
(espaçosa!!!), e quando vejo, já me dominou completamente. Noutras, ela aparece
pela manhã, sedenta. Vem que vem. Já teve noites que eu acordei em seus braços.
Viver com ela não dá. É sufocante.
Essas atividades normais do dia a dia tornam-se um suplício quando ela aparece.
Você se torna insuportável. Talvez por ela ser insuportável. Você só consegue
enxergar um quarto (o seu, é lógico), uma cama (a sua), um travesseiro (nem
preciso dizer) e uma escuridão absoluta.
É, meu querido, ela é fogo. Pra mim, só
um jeito: aceitar sua presença asfixiante, e botar mais um na jogada. Sim, sim,
relação a três. Um ménage à trois. Não
tenha dúvida. Se ela vem, eu corro pra gaveta e pego um Dorflex. Meu
companheiro de tantos anos. Uma atípica relação a três. Se ela vem fogosa, eu chamo
o meu amigo, e juntos damos conta da danada. Tá tudo certo.
Pensando melhor, parece que o meu lado
macho-alfa dá indícios de sua vil existência em algum lugar dentro de mim
(talvez onde Judas perdeu as botas). Mesmo sendo Dorflex o responsável por
organizar meu caos, nessas horas, eu só me lembro dela, da fêmea, da menina, daquela
que me balança, que me arrebata, que me tira dos eixos.
Tá. Sem injustiças vai: juntos, ele,
ela e eu.
Bodas de prata.
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