sábado, 15 de fevereiro de 2014

Kátia

“Foi especial estar com você. Como sempre... Espero que não tenha ficado gripada. Grande beijo”.  Ele mede as palavras e conclui que elas dizem exatamente o que quer dizer. Nem menos nem mais. Na medida. Envia o e-mail e espera que ela o receba com segurança.
Kátia cresceu e hoje é uma menina linda. Gostaria de estar com ela todos os dias. Sente sua falta. Mas o combinado é uma vez por mês. Assim determinou o juiz. Ela parecia resfriada naquele final de semana, mas nunca esteve tão carinhosa. Apesar da distância, ele sente, ah, sente, o carinho, a atenção, o cuidado dela.
Pensou que a separação pudesse alargar a distância entre eles. Como pode? Quando estavam juntos, almoçando, jantando, ou mesmo antes de dormir, ele nunca se sentiu tão próximo a ela quanto agora. Chegava em casa todos os dias cansado, com a cabeça cheia de problemas, não tinha a mínima disposição para brincar. Isso decididamente os afastou. E a culpa foi sua. Quantas vezes ela não o convidou para brincar de pintar, para chutar bola no quintal, para lerem um livro juntos, e ele não arrumou uma desculpinha esfarrapada?
Mas agora tudo parecia diferente. Ele a vê pouco, muito pouco. Gostaria de mais. No entanto, a cada visita, o amor se multiplica. Investe na qualidade. Se não tem quantidade, se não pode ficar muito tempo com ela, então no tempo em que fica ele investe tudo. E dá tudo de si. E dá o melhor que pode.
Kátia nasceu prematura. Ele e Luciana não eram casados. Namoravam havia três anos, mas casamento estava fora de cogitação. Pelo menos pra ele. Nunca a ideia tinha passado pela sua cabeça. Gostava da relação, mas cada um na sua. Mesmo após as complicações do parto de Kátia, ele se manteve firme no propósito de não se casar. Então ela nasceu, passou os primeiros meses no hospital, e de repente, nunca esteve tão junto de Luciana como naqueles meses. E a ideia de ficar longe de Kátia simplesmente o aterrorizou. Um mês após Kátia deixar o hospital, ele se mudou para a casa de Luciana.
Mas o casamento não resistiu à presença física constante, às exigências peculiares de Kátia, à rotina desgastante de uma casa. Como um riacho, que sentindo a falta de chuva, vai lentamente diminuindo de tamanho, o tempo foi passando e quando se deu conta, o casamento tinha secado. De volta à antiga casa, ele não sentia falta de Luciana, e dos momentos alegres que passaram juntos e que não foram poucos, mas do rostinho lindo de Kátia, de seu jeito meigo e natural de ser, do amor que ele sabia que existia, mas que não tinha noção do tamanho.
Ouve o sinal sonoro e vê que Kátia respondeu. “kkkkkkkkkkkk. É claro que eu adorei ficar com você, pai!”. Sente-se bem com o carinho da filha. “E não estou gripada! Para de se preocupar!”.
Liga a televisão e deixa o corpo cair sobre o sofá. Agora só o mês que vem, pensa. Para ele, uma tortura. “Durma bem”. Tenta, através do pensamento, enviar bons fluidos a Kátia.

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